a vida como ela é

A arte de escolher tudo

Eu fui criada com a crença de que não posso ter tudo o que quero, que preciso escolher aquilo que mais quero porque só posso ter isso ou aquilo – nunca tudo. Isso me causou muita dor e sofrimento. Parece exagero, eu sei, mas sempre me senti limitada por essas escolhas. Ser obrigada a escolher entre uma coisa e outra sempre me deixou ansiosa – e se eu escolher errado? No fim, mesmo fazendo a “escolha certa”, acabava deprimida porque sentia que alguma coisa estava faltando… alguma coisa que deixei para trás porque me ensinaram que não posso ter tudo na vida.

Ao longo da minha vida, me treinaram para escolher apenas um brinquedo, entre o curso de idiomas ou a aula de violão, o primeiro computador ou uma viagem para a Disney, entrada para o cinema ou um livro novo, aquele anel ou aquele colar, uma profissão, um lugar para morar, esse carro ou aquele, um casamento até que a morte nos separe… O que ninguém me ensinou é que eu poderia escolher tudo. Talvez não tudo ao mesmo tempo, mas uma coisa de cada vez era, sim, possível.

Então, uns quatro anos atrás, esbarrei num canal do YouTube de uma menina morando em uma van. Assisti alguns vídeos, mas não me inscrevi no canal até o dia em que um novo vídeo dela apareceu no meu feed… ela tinha comprado uma cabana no meio do mato. Entrei no canal dela e descobri que ela tinha feito a compra há quase um ano e estava reformando a cabana com as próprias mãos e sem experiência nenhuma. Ela aprendia, de acordo com as suas necessidades, assistindo vídeos na “Academia YouTube” e fazendo perguntas quando alguém com experiência ajudava ela (por vezes, até pedindo para eles ensinarem ela enquanto faziam o serviço). Eu, que tinha pequenas reformas para fazer no apartamento e nenhum dinheiro para pagar alguém para fazer o trabalho, me inscrevi no canal dela pensando “Se ela consegue, eu consigo”. E, assim, comecei a acompanhar a jornada de Hannah Lee Duggan.

Agora, quatro anos depois, ela ainda tem a van e a cabana… mas também tem uma casa num terreno de 15 hectares, uma Land Rover, uma caminhonete, uma Bronco, uma moto, um apartamento em Nova York, aprendeu carpintaria, andar de moto, viajou pelo mundo, está aprendendo a pilotar avião, tem uma empresa e a sua nova aventura é no jardim – ela quer ter uma horta e plantar o que come. A garota é, praticamente, a versão moderna da Rose DeWitt Bukater Dawson que eu tanto sonhei em ser.

Quanto a mim, inspirada por Hannah, aprendi a me virar sozinha com pequenos reparos e algumas reformas no apartamento. Passo longe da eletricidade porque tenho medo, e do encanamento porque odiaria inundar o apartamento do vizinho sem querer. Parabéns para mim, com tapinha nas costas e tudo!

Agora… onde ficam as escolhas nisso? Bem, eu acompanhei de perto (ou o mais perto que a internet permite de acordo com o que a Hannah compartilha) cada passo da vida dessa garota que morava numa van. E sabe o que eu vi? Eu vi ela escolhendo ter tudo, fazer tudo, ser tudo o que ela queria. Primeiro ela quis viajar por aí numa van, depois ela quis a cabana, depois um carro melhor para rodar nos dias de nevasca… até chegar onde ela chegou agora. E sabe o que eu não vi? Eu não vi ela deixando nada para trás, escolhendo uma coisa ou outra. Ela fez tudo o que queria, uma coisa de cada vez. Ela tem tudo o que quis, comprando uma coisa de cada vez. Ela é o que ela quer ser. E eu quero ser como ela.

Meu sonho de infância é ter um jipe azul (se for um Wrangler novinho, não vou reclamar, mas o meu coração bate forte por um clássico Willys dos tempos da minha vó). Não é um carro prático para ter na cidade – e minha mãe não gosta. Se eu não tivesse essa necessidade de agradar a minha mãe, provavelmente já teria mandado a praticidade para o inferno e comprado o meu tão sonhado jipe. Mas não suporto a ideia de ouvir minha mãe dizendo “Eu disse que era um carro ruim” quando ele der problemas – porque vai dar, afinal, é um carro velho. O que eu não levo em consideração é outro desejo meu: eu sempre quis aprender sobre carros; mecânica. E se eu fosse um pouco Hannah, já teria aprendido isso faz tempo.

Foi essa linha de pensamento – sobre o azulão dos meus sonhos – que me fez perceber algo que estava bem ali, na minha cara, esse tempo todo, ao longo dos quatro anos que acompanho Hannah: eu posso ter tudo, fazer tudo, ser tudo que eu quiser. Só é preciso um pouco de paciência, algum planejamento, e um grande “Foda–se, eu quero é ser feliz”.

E daí se der errado? Qual é o problema se me arrepender? Pelo menos eu fiz, eu aprendi, eu experimentei tudo que despertou vida em mim.

Minha mãe não gosta de jipe e disse que vou me arrepender, minha madrinha disse que carro velho é feio. Eu convivo com as duas porque, no momento, sou obrigada. Mas eu tenho planos… uma casa fora da cidade e meu jipe azul, só para começar. E eu tenho um vizinho – um senhor simpático na casa dos 70/80 anos – que adora caminhonetes e jipes, e me disse que tenho bom gosto e não vou me arrepender – e que, se eu quiser, vai me ajudar a escolher o jipe certo. Abençoado seja!

Eu também tenho planos para aprender andar a cavalo, ter uma casa na praia, aprender freediving, aprender a tocar violão, aprender sobre carros para não depender mais de mecânicos que se aproveitam de mulheres indefesas e de concessionárias com seus preços abusivos, conhecer todos os lugares da minha lista, ter a minha própria editora, abrir um santuário animal… Eu quero, definitivamente, fazer mais e assistir menos. E quero viver cada dia de acordo com os meus sonhos e desejos, sem medo de ser feliz.

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